Há uma diferença essencial entre a infância e a vida adulta. Na infância você tem muitos sonhos e pouca realidade. Na vida adulta você tem muita realidade e poucos sonhos.
Das poucas certezas acerca da vida, entre elas está a morte. Mas podemos ter outras certezas. A certeza de que o futuro vai ser diferente dos nossos sonhos de infância.
Lembra daquela manhã de sábado, quando os raios de sol derretiam a geada na grama úmida? Você teve um lampejo de esperança e viu o futuro e o imaginou construído diante dos seus olhos. Sim! Ele era possível! A partir daquele momento ou de outro qualquer, cujo significado revelador instalou-se em nós, uma semente de esperança foi plantada no fundo dos nossos corações. E no solo inocente de uma criança, toda semente germina.
Quando o futuro chegar, muito antes de estarmos preparados, e bater à nossa porta, os sonhos mais singelos da infância tornar-se-ão apenas memórias nas estrelas do céu.
Havia uma vida infinita, repleta de alegrias e aventuras, um futuro que se antecipava através das brincadeiras, do imaginário, um futuro em sua plenitude. Seríamos quem escolhêssemos ser, sem amarras, sem realidade.
Todos carregamos aquela semente da infância. Ela está guardada no lado esquerdo do peito. Por isso, o peito dói diante das guerras, da miséria humana, da palavra cortante, do olhar desdenhoso, da mão que não aceita nossas mais sinceras desculpas. Uma semente viva e calada.
A realidade impõe-se. Mas a felicidade refugia-se no coração adulto que brinca em continuar criança, que protege a sua semente, que é leal aos seus sonhos.
A vida chega através dos anos e, pelos sofrimentos de todas as ordens, dobra nossa coluna e nos faz chorar . A vida permite que os acontecimentos inerentes ao existir, ao conviver com o próximo, execute cruamente a sua obra , sem adiamentos, nem negociações humanas.
E a semente que mora no nosso coração sente todas essas emoções duras. Muitas sementes vagueiam pelas ruas e praças e parecem desvitalizadas, mas isso é apenas aparência. É impossível viver sem a fonte mais confiável de esperança, a semente encravada no coração.
Quando conseguimos transformar a vida na nossa brincadeira favorita, por instantes, reencontramos os nossos sonhos e eles invadem a vida adulta, que se torna inocente outra vez. A realidade rende-se aos sonhos. São momentos mágicos, mas muito breves. E quando a realidade retoma o controle, ficamos adultos novamente, estonteados, querendo agarrar o último fio de esperança que evapora nos raios do sol poente.
Se isso ainda não lhe aconteceu, creia, esse dia vai chegar. E teremos motivos para viver. E esperaremos esse reencontro como esperamos ansiosos o primeiro amor.
A rotina dos dias e a palidez das horas faz-nos esquecer que a vida é buscar eternamente esse reencontro.
Dentro do peito de cada um de nós está plantada uma semente. Ela anseia por viver. Ela clama por viver. Você merece viver os seus sonhos de infância.Naquela manhã de sábado, diante de seus olhos, esses sonhos foram semeados de esperança pela visita inesperada do futuro. Agora você percebe? Há um mundo lá fora que precisa de suas mãos inocentes para molda-lo.
Olá Dr.Marcos,
ResponderExcluirDesde muito cedo por volta de sete anos de idade percebi que minha família possuía sérios problemas financeiros, mesmo sem ainda saber o que são problemas financeiros. Via meu pai angustiado minha mãe calada andando de um canto para outro na casa muitas vezes não tendo a oportunidade de se posicionar diante da situação. Meu pai possuía um bom emprego em uma companhia pública estadual e um salário razoável o suficiente para que possuíssemos uma vida tranqüila e sem privações “médias”, mas não era o que acontecia, pois meus progenitores eram desorganizados e cada decisão tomada era apenas mais um passo para a construção de um futuro triste e sem luz.
Diante dos acontecimentos relatados e muitos outros omitidos aqui, alguma coisa em minha mente forçava-me a enxergar o mundo dos adultos mesmo que com olhos e inocência de criança. Lembro-me de quando mesmo sem entender os motivos eu me isolava das pessoas, fazia o possível para estar na rua andando de bicicleta ou caminhando sem destino, apenas cantarolando algumas canções, conversando baixinho comigo mesmo como se estivesse fugindo da realidade que eu teimava em não aceitar.
Foi um período dolorido tive que aprender a me defender das pessoas mesmo que de uma maneira não inteligente, pois acreditava que estas eram sempre más e não confiáveis, “e muitas delas eram mesmo”. Hoje tenho consciência que o isolamento o ato de fugir da realidade existente se dava para que eu pudesse sonhar construir um mundo em minha cabeça onde eu não tivesse dificuldade alguma, um mundo que me dava sensação de liberdade, respeito e poder. Desisti de estudar muito cedo, pois o ultimo lugar no mundo que eu queria estar era em uma sala de aula e não entendia porque, era inquieto, minha cabeça estava a duzentos por hora em um turbilhão de pensamentos, todos em minha volta me condenavam me apontavam e eu me sentia DIFERENTE como uma peça que não faz parte de um determinado quebra-cabeças. Mas a coisa mais incrível era que em muitos “sábados” em que eu observava o sol derreter a geada na grama úmida tive lampejos de esperança vi o furo e o imaginei construído diante de meus olhos!
Eu cresci tentei realizar muitos dos sonhos que tinha, e acredite alguns eu consegui, mas como a sociedade é baliza na vida de todo indivíduo um dia desses descobri que passei um precioso período de minha existência em busca de algo que eu imaginava que me traria liberdade, segurança e me fizesse ser respeitado, esse algo buscado era dinheiro! Que tolo ! Agradeço por ter acordado ainda a tempo de enxergar que minha família passava por dificuldades não por falta de dinheiro, mas sim por falta de estudo, conhecimento, crescimento intelectual que com certeza são as únicas coisas nessa nossa (como canta a musica de Toquinho e Vinicius) “linda aquarela que um dia enfim irá descolorir” que pode nos dar liberdade segurança e respeito.
Sei que a semente da infância está em meu peito, por isso, “choro diante das guerras, da miséria humana, da palavra cortante, do olhar desdenhoso, da mão que não aceita nossas mais sinceras desculpas”, diante disso, só me resta proteger essa semente com muito amor, carinho e respeito e lhe dar como alimento estudo e amor ao próximo, pois sei o quanto é difícil viver na escuridão da ignorância acreditando que está tomando as decisões certas.
Acredito que agora sim tenho mãos inocentes e que estas podem ajudar a moldar o mundo.
Luiz Schuster
Sem palavras.
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